Os Evangélicos e a
Grande Esperança Trump
11 de julho de 2016
Como foi que os brancos protestantes evangélicos -
autointitulados "eleitores de valores" - se tornaram um bloco de
apoio incondicional a Donald J. Trump?
Um encontro recente, cuidadosamente coreografado, entre
Trump e líderes evangélicos nos permitiu vislumbrar como muitos estão tentando
decifrar essa equação. James C. Dobson, o fundador e antigo diretor de Focus on
the Family - uma figura ainda influente nos círculos cristãos conservadores -,
afirmou ter recebido informações de segunda mão dizendo que Trump passara
"a aceitar um relacionamento com Cristo" e que Trump deveria
"ter algum crédito" sendo ele ainda "um
bebê em Cristo".
O antigo pré-candidato a presidente Mike Huckabee, um pastor
batista cuja filha, Sarah, é importante conselheira de Trump, carimbou
"valores familiares" no candidato ao testificar
a proximidade de Trump junto a seus filhos adultos. Huckabee descreveu seu
relacionamento como "um dos mais admiráveis relacionamentos de pai e
filhos que já vi".
Mas ainda que Dobson e Huckabee façam o maior esforço para
ajudar os evangélicos a justificarem o apoio automático ao candidato
republicano, o rev. Robert Jeffress,
o influente pastor titular da Primeira Igreja Batista em Dallas e membro
proeminente do comitê consultivo evangélico de Trump, deu uma razão muito mais
utilitarista para o apoio a Trump para presidente. Ao invés de tentar defender
as credenciais cristãs de Trump, Jeffress disse
sem rodeios que face às conhecidas ameaças que os evangélicos enfrentam,
"Eu quero o filho-da-mãe mais malvado e durão que eu puder achar para o
papel, e acho que é isso o que muitos evangélicos também querem".
A vulnerabilidade extrema expressa por Jeffress é
fundamental para entender o apoio dos evangélicos brancos a Trump e o esforço
imenso que líderes evangélicos têm feito para poder fazer campanha por ele.
Líderes como Jeffress identificam as ameaças à sua segurança no mundo exterior
que os cerca.
Mas a raiva, ansiedade e insegurança sentidas por muitos
evangélicos brancos contemporâneos são melhores entendidas como uma resposta a
uma crise de identidade interna precipitada pelo fim da “América cristã
branca”, o mundo cultural e institucional construído principalmente por
protestantes brancos que dominaram a cultura americana até a década passada.
Hoje, os evangélicos brancos não apenas veem o declínio de
seus próprios quadros como também enfrentam realidades demográficas e culturais
mais amplas e genuinamente novas. Quando Barack Obama se elegeu presidente em
2008, os cristãos brancos (católicos e protestantes) constituíam a maioria
(54%) do país. Hoje, este número baixou para 45 porcento. Durante o mesmo
período o apoio ao casamento gay - um assunto-chave para os evangélicos -
passou de apenas quatro em cada dez para uma ampla maioria, e a Suprema Corte
abriu caminho para que casais homoafetivos se casem e todos os cinquenta
estados. A própria Suprema Corte simbolizou tais mudanças ao perder seu último
membro protestante, John Paul Stevens, em 2010.
Uma recente pesquisa
de Public Religion Research Institute - Brookins mostra o porquê os
protestantes evangélicos brancos estão se sentindo alarmados, na esteira das
mudanças demográficas e culturais. Quase dois terços se incomodam quando
encontram imigrantes que praticamente não falam inglês. Mais de dois terços
creem que a discriminação contra brancos tornou-se um problema tão grande
quanto a discriminação contra outros grupos. Quanto à discriminação contra
cristãos, o número chega a oito em cada dez. E talvez o dado mais revelador de
todos seja o de que sete em cada dez protestantes evangélicos dizem que o país
mudou para pior desde a década de 1950.
Em grande medida, Ted Cruz, o filho de um pastor evangélico
e ele mesmo um batista do sul, deveria ser o candidato a presidente dos
evangélicos em 2016. Mas Trump conquistou os evangélicos ao abordar
explicitamente seu senso de perda mais profundo. Cruz garantiu aos evangélicos
que os protegeria das novas realidades, enquanto Trump prometeu devolver seu
papel de protagonistas do país. Cruz ofereceu-se para negociar uma estratégia
de retirada digna, enquanto Trump jurou fazer o tempo voltar.
A promessa de Trump de “fazer a América grande novamente”
significa algo específico para os protestantes evangélicos brancos. Trump
entrou em cena no momento em que a cortina baixava marcando o fim da era da
dominância branca protestante.
A ascensão de Trump transformou as eleições de 2016 em um
referendo sobre a morte da América cristã branca, sendo ele o candidato que
atraiu mais aqueles que mais lamentam essa perda. Trump compreendeu isso
instintivamente desde o começo de sua campanha. Tome como exemplo seu discurso
em uma faculdade evangélica antes dos caucuses de Iowa em Janeiro: "Digo-lhes
uma coisa: assim que eu for eleito presidente, nós estaremos dizendo 'feliz
natal' de novo". Ele
acrescentou que o cristianismo ressurgiria "porque se eu estiver lá,
vocês terão bastante poder - vocês não precisarão de mais ninguém".
A forma como os evangélicos brancos responderem será
importante para o futuro do experimento democrático americano. Caso seus
profundos sentimentos de nostalgia e vulnerabilidade levarem-nos a abraçar
Trump como um meio direto de voltar ao poder, podemos esperar, se ele vencer,
mais processos judiciais e agitação civil, seguidos de mais igrejas politizadas
e uma crescente polarização política ao longo das linhas culturais e raciais.
Por outro lado, caso os evangélicos de alguma forma invoquem
uma resposta que esteja enraizada em uma aceitação real de seu lugar
não-central na nova América, eles podem descobrir que têm um papel crítico a
desempenhar na revitalização de nossa vida cívica.
Robert P.Jones, fundador e CEO de Public Religon Research
Institute, é autor de “The End of White Christian America”.
Tradução: Fabio Martelozzo Mendes ( fabiomartelozzo@gmail.com )
Fonte: http://www.nytimes.com/2016/07/11/opinion/campaign-stops/the-evangelicals-and-the-great-trump-hope.html?